quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Conhecer um pouco mais, nunca é demais!

Aproveitando essa semana linda, dedicada as CRIANÇAS, trago um artigo interessante, e que tem td a ver com a data...foi através dele que gostei da leitura. Tomara que vcs gostem.




Monteiro Lobato gostava de conversar com a menina Emília, a bonequinha de pano que ele próprio havia inventado e apresentado ao público no livro A menina do narizinho arrebitado, de 1920. Dizia que ela se sentava ao lado da máquina de escrever e, a todas as suas indagações, afirmava: “Eu sou sua independência ou morte, porque sou você mesmo”.

Acontece que Emília era o alter ego de Lobato, curiosa, falava demais e tudo o que tivesse vontade. “Ele conversava muito com ela e era exatamente assim: um homem que enfrentava tudo, que queria descobrir, experimentar, provocador, revolucionário”, relembra a escritora Tatiana Belinky, 91 anos, amiga do escritor no final de sua vida e a responsável, junto com o falecido marido Júlio Gouveia, pela primeira adaptação do Sítio do Picapau Amarelo para a televisão, em 1951, na extinta Tupi de São Paulo.

Mas Emília era apenas a gênese do universo intricado de José Renato Monteiro Lobato, o menino que nasceu na cidade paulista de Taubaté, em 18 de abril de 1882. Isso porque seu mundo era muito mais amplo e complexo do que as histórias que lhe trariam fama na literatura. Era conservador? Era modernista? Depende do ângulo de que se olha. Fato é que sempre esteve à frente de seu tempo. Foi ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), espírita, investiu dinheiro, saúde e sua liberdade na defesa do petróleo nacional e, acima de tudo, transformou a literatura infantil brasileira ao lançar mais de 30 títulos da série Sítio do Picapau Amarelo – além de duas dezenas de livros e romances destinados aos adultos.

“Lobato fundou a literatura infantil no Brasil. Não tenho memória de nada tão importante, nem antes nem depois dele. E não há ninguém com essa irreverência e essa criancice toda”, destaca a escritora de literatura infantil e juvenil Fanny Abramovich, 70 anos. “Ele é mais do que uma influência, porque ele é fundamental, mora dentro de mim”, completa.

AS MUITAS ESTRADAS 
José Renato tinha apenas 11 anos quando resolveu mudar seu nome para José Bento. O motivo? Usar uma bengala que havia ganhado de herança antecipada e com as iniciais do pai José Bento Marcondes Lobato. Esse tipo de decisão era apenas uma faceta do garoto de personalidade forte que vivia enfurnado na imensa biblioteca do avô, Visconde de Tremembé, lendo Estranhas aventuras de Robinson Crusoé e toda a obra de Júlio Verne.

Na adolescência, colaborou com pequenos jornais literários de sua cidade natal e alguns de São Paulo, enquanto era interno do Instituto de Ciências e Letras. Mas perdeu muito de suas referências aos 16 anos, quando morreu seu pai, vítima de congestão pulmonar, e um ano depois sua mãe, Olímpia Augusta Lobato, que passava por uma profunda depressão.

Órfão e com 17 anos, Monteiro Lobato precisava dar vazão à paixão pela literatura e pelo desenho. Mas, se a vontade era cursar a Faculdade de Belas Artes, foi em direito que se formou, por imposição do avô. Isso não o impediu, no entanto, de participar dos movimentos literários estudantis na Faculdade do Largo de São Francisco.

Depois de formado, adiou o sonho artístico ao assumir a promotoria pública da pequena cidade de Areias (interior do estado) em 1907. E, no ano seguinte, casou-se com Maria Pureza da Natividade, a Purezinha, com quem ficou até o fim da vida. Casado e apaixonado, Lobato se esforçava, sem sucesso, para ser feliz como promotor e negociante. Tentou de tudo: fundar uma fábrica de doces em calda, sociedade em um negócio de estradas de ferro e a vida de fazendeiro, quando, aos 29 anos, mudou-se com a família para a Fazenda S. José do Buquira, deixada pelo avô. Perto dali, na Chácara do Visconde, em Taubaté, existe o Museu Monteiro Lobato, aberto diariamente para visitação.

Mas seu destino era escrever. Talvez por isso, o sucesso na literatura viria do acaso, em 1914. Na época, Lobato, pai de Marta, Edgar e Guilherme – Rute, a quarta e última filha, nasceria em 1916 –, escreveu uma carta indignada para O Estado de S. Paulo reclamando das constantes queimadas praticadas pelos caboclos que moravam na região de sua fazenda. Intitulado Velha praga, o texto alavancou o nome de Lobato.

Motivado, o escritor mudou-se para São Paulo em 1916 e, em pouco tempo, já escrevia constantemente no jornal e em revistas, além de lançar, em 1918, o primeiro livro O Saci Pererê: resultado de um inquérito. Embalado, comprou nesse mesmo ano a Revista do Brasil e fundou, em 1925 no Rio de Janeiro, a Companhia Editora Nacional.

PICAPAU AMARELO
Falar de Monteiro Lobato é falar de infância e, consequentemente, sobre o Sítio do Picapau Amarelo. Na fábula, dona Benta vive feliz em um sítio com seus netos Narizinho e Pedrinho e a cozinheira negra Tia Nastácia. Certo dia, Narizinho sai pra passear com Emília, a boneca de pano muda que começa a falar desenfreadamente depois de tomar uma pílula mágica do Doutor Caramujo. Irreverente, ela apronta todas na companhia de Visconde de Sabugosa, um aristocrático boneco de sabugo de milho, o leitão Marquês de Rabicó, o burro Conselheiro e tantos outros personagens.

“O Sítio é o território da infância, onde ninguém trabalha, ninguém faz nada. Não existe pai nem mãe, só duas avós que brincam com as crianças o tempo todo”, enfatiza Fanny.

A mesma certeza tem Tatiana Belinky, que, de 1951 a 1963, foi roteirista e responsável, com o diretor Júlio Gouveia, pela primeira adaptação da série para a TV Tupi. “Foram 12 anos ao total. É um grande prazer e honra ter feito a sé- rie e ela ter sido tão bem recebida. A gente fazia ao vivo um episódio por semana, sempre em horário nobre. E a criançada corria pra frente da TV”, conta ela.

Nos livros ou na TV – na qual ganhou adaptações em todas as décadas seguintes –, é difícil apontar quem não viveu no universo lúdico da série de Lobato e não tenha se apaixonado pela menina Emília.

“Emília é uma história à parte. Quem não quer ser igual a ela, independente, que sabe o que quer, que enfrenta todo mundo? Quando eu quero ser sacudida, não preciso de nenhum psicanalista. Basta ler Emília brinca Fanny, autora de O estranho mundo que se mostra às crianças (1983, esgotado) e Brincando de antigamente (1996, esgotado), entre outros.

POLÍTICA E PETRÓLEO
O mesmo homem celebrado pelas histórias infantis seria perseguido pelo governo de Getúlio Vargas nos anos 1930. Lobato encabeçava campanha pela soberania brasileira na extração e refino do petróleo enquanto o discurso governamental buscava facilitar a exploração por parte de empresas estrangeiras.

Sem se intimidar, o escritor gastou as últimas economias na fundação de quatro empresas de perfuração, sem jamais recuperar o investimento. Depois, perdeu prematuramente os dois filhos. Primeiro Guilherme, em 1938, depois Edgar, em 1943, ambos vitimados pela tuberculose, e ficou preso em 1941 por três meses durante o Estado Novo, por fazer duras críticas ao Conselho Nacional do Petróleo. Curiosamente, dois anos antes, em 1939, o petróleo foi descoberto em Salvador, em uma área chamada Lobato.

Mas a vida de Monteiro Lobato nunca mais foi a mesma. Foi perseguido por Getúlio e pelo governo seguinte, de Eurico Gaspar Dutra. E, do inconformismo com o país, escreveu Zé Brasil (1947), o último livro da carreira e que trazia à tona mais uma vez seu famoso personagem Jeca Tatu, dessa vez transformado em sem-terra.

A morte veio em 4 de julho de 1948, após um espasmo cerebral. Dia antes, como Maria José Sette Ribas, a já falecida revisora por toda a vida contou no livro Monteiro Lobato e o espiritismo (2004), o escritor assim se despediu: “Minha flha, amanhã ou depois, se vir no jornal que eu morri, você não vai chorar. Sabe bem que não morremos e esta foi, apenas uma de minhas passagens sobre a terra. Somos imortais”.

Fonte: http://www.revistadacultura.com.br:8090/revista/rc39/index2.asp?page=perfil

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